sexta-feira, 17 de julho de 2009

quarta-feira, 8 de julho de 2009

PARCERIA INÉDITA NO NORDESTE TEM COMO OBJETIVO A MONTAGEM DA PEÇA “FARSA DA BOA PREGUIÇA”, DE ARIANO SUASSUNA




Espetáculo será a segunda montagem do grupo paraibano Ser Tão Teatro, único no Nordeste contemplado no edital Programa Eletrobrás de Cultura 2009. A aprovação inclui ainda a circulação da peça.

A “Farsa...”, é um espetáculo mambembe, com música ao vivo, elementos circenses, uso de máscaras e de bonecos. Irá circular em praças públicas por cinco estados nordestinos (PB, PE, CE, RN e AL), totalizando 15 apresentações gratuitas, divididas entre as capitais e mais 10 outras cidades dos estados citados.

Para a montagem da Farsa da Boa Preguiça, o jovem grupo Ser Tão convidou o renomado Coletivo potiguar para uma experiência inédita de compartilhamento estético entre dois grupos nordestinos de teatro de pesquisa: o grupo Clowns de Shakespeare, do Rio Grande do Norte, que tem mais de 15 anos de pesquisa e dezenas de prêmios nacionais, incluindo o Prêmio Femsa Coca Cola de Teatro Infantil com “Fábulas”.

A produção executiva do projeto “Farsa da Boa Preguiça” é assinada pela TRATO Assessoria e Produção Cultural.

Segue a entrevistas com os diretores: Christina Streva & Fernando Yamamoto:


Christina Streva é diretora teatral, produtora e coordenadora de Cultura da Universidade Federal do Rio de Janeiro- UNIRIO. Fundadora do Coletivo Ser Tão Teatro, Streva traduziu, escreveu e dirigiu espetáculos teatrais tanto no Brasil quanto no exterior. Dentre eles estão : A Farsa do poder ( 2008), Vereda da Salvação ( 2007), Nunca Treze à mesa ( 2005), Taj Mahal ( 2004), Cenas de uma Execução (2001), etc. Scholar da Fundação Fullbright, Streva é graduada em direção Teatral pela Lawrence University ( 1996) nos Estados Unidos e Mestre em Teatro pela UNIRIO. Atualmente é professora do Departamento de Interpretação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
TRATO - Como é sair de uma tonalidade trágica do fanatismo religioso como o Vereda da Salvação para uma tonalidade colorida do folclore nordestino e da obra de Ariano Suassuna?

Christina Streva - A primeira coisa que chamou minha atenção quando recém chegada à Paraíba foi a questão da religiosidade. A forma como a religião, um direito privado e individual, invade o espaço público sem pedir licença, nas rádios, nos shoppings, nos consultórios, nos discursos evangélicos presentes por todos os lados etc. Realmente me incomodava muito. Esse incomodo se traduziu no desejo de abordar, através de Vereda da Salvação, o perigo de uma religiosidade exacerbada e invasiva. Com o tempo, fui descobrindo um outro aspecto muito mais rico e interessante da religiosidade nordestina. O seu lado mitológico, folclórico e alegre, que mistura homens e deuses nessa tradição tão rica e viva da cultura popular. Explorar e descobrir esse universo através da Farsa da boa Preguiça, é voltar ao tema, mas agora utilizando outra lente.
TRATO - Após três anos de uma trajetória de sucesso na Paraíba, você voltou para o Rio de Janeiro. Por que este retorno? E como você esta conduzindo o grupo Ser Tão?
CS - A experiência de viver e lecionar na Paraíba foi extremamente rica e deixará marcas profundas tanto no minha arte como na minha vida. Porém eu já estava há três anos longe de casa, e algumas questões familiares começaram a pesar muito e exigir minha volta. A oportunidade surgiu através de um convite da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro para que eu assumisse a Coordenação de Cultura da UNIRIO, universidade na qual eu fiz meu Mestrado e dei aulas. No entanto, o grupo Ser Tão continua sendo o meu grupo, as pessoas que escolhi para trabalhar e desenvolver minha pesquisa artística. Essa relação não mudou. Nosso contato é diário, através da internet e do skype. E a cada dia descobrimos novas formas de manter acesa essa chama.
TRATO - O que representa essa aprovação na Eletrobrás para o teatro paraibano e para o próprio grupo Ser Tão?
CS - O Ser Tão é ainda um grupo em formação. A primeira montagem foi um grande desafio, o inicio, o engatinhar...O elenco é quase todo de estudantes da UFPB, e o tempo e a dedicação que se exigiu para a montagem de Vereda da Salvação foi uma superação de todos, uma mudança de atitude com relação ao oficio e a universidade. O fato de uma comissão de notório saber das Artes Cênicas ter reconhecido o trabalho desse grupo e selecionado o projeto em edital publico dentre centenas de projeto de todo o Brasil é agora a prova para todos nós de que trabalho e dedicação realmente compensam.
TRATO - Porque convidar o Clowns para fazer parte desse processo?
CS - Ao longo da minha vida, tive contato com diversos grupos de teatro. Porém, nenhum deles foi tão aberto ao dialogo, transparente e generoso como os Clowns. A aproximação dos dois grupos foi natural e gradual a partir de uma afinidade muito grande que se estabeleceu entre o Fernando Yamamoto e eu. Essa amizade acabou se alastrando para os dois grupos. As parcerias artísticas como a Primeira Mostra de Teatro de Grupo realizada pelo Ser Tão na Paraíba e com a presença dos Clowns e os encontros na Lapada só aumentaram o desejo de aprofundarmos essa troca humana e artística.
TRATO - O que você espera dessa parceria?
CS - O Clowns trás uma grande experiência nesse universo da cultura popular e da comicidade. Mas trás também o exemplo de um coletivo de resistência, que se mantém junto, apesar de todas as dificuldades, há mais de quinze anos, com um trabalho sério, constante, e sempre inovador. Para o Ser Tão será uma grande escola: a troca estética, mas também a chance de estar ao lado de um grupo que é um exemplo de vida e de relação com a arte.
TRATO - Edital aprovado. Contrato assinado. E agora?
CS - Agora é trabalhar! Os dois grupos chegam no Rio de Janeiro dia 01 de Dezembro e temos dois meses de intensivão na cidade. Em Fevereiro o trabalho de montagem do espetáculo continua em Natal e em Março partimos para as apresentações em quinze cidades do Nordeste, estreando na Paraíba.


Fernando Yamamoto é um dos fundadores do grupo Clowns de Shapespeare (RN). Dirigiu os espetáculos “Sonhos de uma noite de verão”, “Noite de Reis”, “Sonhos de uma noite só”, “Teste de Teca”, “Men Meet Woman”, “Picadinho Clowns”, “Mundo Barulho por Quase Nada”, “Roda Chico”, “O casamento do pequeno burguês” e “Fábulas”. É também ator e professor de teatro. É graduado em arquitetura e especialista em ensino de teatro pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
TRATO - De que forma começou a aproximação do Clowns com o Ser Tão?

Fernando Yamamoto - A aproximação entre os Clowns e Ser Tão se deu a partir do meu encontro com a Christina Streva em 2006, quando fomos debatedores da Mostra Paraibana de Teatro e Dança. Durante uma semana tivemos a oportunidade de discutir e trocar experiências a partir dos espetáculos que tínhamos que debater. Esse encontro gerou uma empatia imediata, tanto pessoal, quanto de afinidades estéticas. A partir de então, nossos grupos também começaram a se aproximar, principalmente n'A Lapada, que é um movimento de grupos do RN, CE e PB, que tem como foco principal gerar trocas artísticas entre esses grupos. Isso já gerou alguns frutos, como uma colaboração do Marco França, que é ator e diretor musical dos Clowns, no processo do Vereda, e com uma ida minha a João Pessoa no início deste ano, para fazermos um trabalho em cima do mesmo espetáculo.

TRATO - Me fala um pouco sobre essa experiência de dois grupos de teatro, de Estados e trajetórias diferentes (do ponto de vista de que o Clows já tem um repertório, experiência e anos de pesquisa de grupo e o Ser Tão um grupo jovem, inexperiente ainda mas com uma montagem importante como o vereda e que caminha pra sua segunda montagem) - enfim, essa troca, o que isso pode vir a representar para o teatro nordestino hoje, em meios há tantas discussões de coletividade, de trocas estéticas?

F Y - Estamos diante de um momento muito especial, que é a efetivação desta troca com a realização de um processo de montagem conjunto. Apesar da efervescência de ações de compartilhamento que vêm acontecendo em todo o país, experiências como esta, de realmente uma troca longa, na realização de uma montagem, ainda são raras. Tentando fazer uma mapeada, só consigo me lembrar de duas experiências mais recentes, que foram a montagem da intervenção cênica "A última palavra é a penúltima", em que o Teatro da Vertigem (SP) convidou os grupos Zikzira (MG) e Lot (Peru), e do espetáculo "Barco de Gelo", criação conjunta dos grupos XIX (SP) e Espanca! (MG). No Nordeste, ao menos na produção teatral mais recente, é uma iniciativa inédita.

TRATO -Além disso, que outros fatores contribuiram para essa parceria teatral entre os dois grupos?

FY -Pra nós, dos Clowns, é um momento de efetivar uma experiência que consolida a busca dos últimos anos: compartilhar experiências com outros grupos, e fortalecer o teatro de grupo do Nordeste. Acho que, com a Farsa da Boa Preguiça, andamos nestas duas direções de forma muito sólida.

TRATO
- O que você espera desta parceria?

FY - Acredito que este processo trará um crescimento enorme para os dois grupos. Apesar de já termos mais tempo de estrada e o Ser Tão ser um grupo em processo de consolidação - e acredito que este processo será um grande catalisador para eles -, no momento em que decidimos entrar neste trabalho, os dois grupos entram em condições de igualdade, cada um trazendo o que tem de melhor para esta troca. Além da minha direção em conjunto com a Christina, e do elenco conjunto, a música e a iluminação serão assinadas por integrantes do grupo, o Marco França e o Ronaldo Costa. São áreas muito fortes na nossa pesquisa, que acredito que poderemos contribuir muito para o processo. Por outro lado, o Ser Tão, além de toda força e visceralidade do trabalho dos seus atores, vêm com a experiência da direção da Christina. Assim, os dois grupos trazem o que têm de melhor. No momento em que o processo iniciar, deixamos de ser "nós" e "eles", e passamos a ser um só grupo para estes três meses de criação.